sexta-feira, 17 de abril de 2009

Um conto sobre vésperas

Véspera de feriado. Tive uma semana estranha. Muitos pensamentos bizarros e paranóias me perseguem. Mas fora isso muitas coisas boas tem me acontecido. Boas e novas. Dessas coisas, umas são mais marcantes, e dessas coisas marcantes surgem as histórias que me divertem no trajeto do trabalho e antes de pegar no sono. Algumas têm final feliz, outras nem tanto.

Nem só peru...

O feriado era prolongado. A viagem com os amigos estava marcada desde o início do ano. De manhã bem cedo o jovem estagiário faz uma pequena lista do que ainda faltava providenciar, já que a mala estava pronta há dois dias. Na lista constava: farmácia, banco e gravar cds para viagem. Isso tudo deveria ser feito durante o trabalho, então ele precisava correr.
Na parte da manhã ele pesquisou blogs e sites de relacionamento pra checar o que a “galera bacana” andava ouvindo. Não queria se mostrar ultrapassado para os amigos. No horário do almoço, pegou um folheado com refresco na padaria e foi riscar outros itens da lista. Na saída da farmácia, o jovem que ouvia algumas músicas recém-baixadas no ipod estava focado demais nos planos do feriado pra participar do mundo exterior. Levou tylenol, neosaldina, engov, preservativos, desodorante, gilete, repelente, advil, guaraná em pó, vitamina C, piroxicam, loção pós-barba, eparema e saiu avoado. Deixou o caixa gritando para avisar que tinha troco. Um morador de rua, habitante daquela quadra, se interessou pelo troco e estendeu a mão com cara de piedade demonstrando que não se importava em ficar com aquela “diferença” que daria no caixa. O Caixa, que já estava contaminado pela alegria pré-feriado sorriu da ousadia do mendigo e dando de ombros deu-lhe os 60 centavos.
De volta ao trabalho, só faltavam 4 horas para pegar a estrada.
Felizmente não foi preciso desenvolver mecanismos de contagem regressiva, como costumava fazer nas tardes de sexta-feira. Muito trabalho lhe apareceu sob a mesa, e o tempo passou voando. Demais. Eram 17:53 quando conseguiu terminar o último relatório. O escritório já estava vazio. Muitos saíram mais cedo pra evitar o trânsito caótico desse dia. E o celular do jovem começava a receber os primeiros torpedos. “Estamos aí em 10 min”. “Ñ atrase o trânsito ta bizarro”.
Ainda faltava gravar os CDs, eram quatro coletâneas (Novidades/Feriadão/Recordar/Euforia) que pelos seus cálculos seriam suficientes para não precisar se submeter aos gostos duvidosos dos amigos durante toda a viagem. 20 minutos depois, quatro CDs queimados, computador desligado, o jovem tenta se espremer no elevador. Vai pelas escadas. O carro dos amigos já está parado a três quadras dalí e quatro novos sms foram enviados cobrando pelo atraso. Mesmo dentro do atraso, tudo é perfeitamente planejado, até a música que toca no ipod foi escolhida para o momento (uma que fazia parte do cd Euforia). A fila na catraca é imensa, o jovem não consegue segurar o sorrido enquanto cantarola a música, mas a fila não anda. Ele nem percebe. Está praticando air guitar de olhos fechados.
Quando deixa o edifício, é necessário voltar ao início a música que foi programada para o momento e já tinha acabado. O mendigo continuava ali na esquina, agora com um radinho de pilha ouvindo Nessun Dorma. Também de olhos fechados. Um táxi ultrapassa um ônibus, que pára fora do ponto para pegar uma mulher bem alinhada que fala ao celular. O taxista se vira pra xingar o motorista que continua sorrindo pra mulher enquanto ela sobe os degraus do ônibus. Depois de xingar toda a ala feminina da família do motorista, o taxista vira-se pra frente. Mas já é tarde. O jovem cai com a cabeça no meio fio. A mochila e o ipod ficam aos pés do mendigo que saí abrindo espaço em meio ao aglomerado que se forma, e passa a habitar outra quadra. Agora ele ouve “A Crippling Blow” no ipod.

...morre na véspera.

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