sexta-feira, 16 de abril de 2010

Meu macacão listrado

A lembrança surgiu durante uma conversa onde eu dizia: vou me preparar para sua chegada...e coisas do tipo. Na hora me veio essa recordação que estava muito bem guardada no meu subconsciente ( ou algo que o valha), porque, eu de certa forma sentia certa vergonha desse episódio.

Devia ser por volta de 1989, nessa época eu havia descoberto hábitos caseiros, ficava em casa curtindo meu quarto, fazendo decorações, limpeza (!), escrevendo cartas, e assistindo TV Cultura, tudo isso no meu quarto, porque eu tinha acabado de ganhar uma TV. Eu nunca fui uma menina muuuuito feminina, mas tinha meus momentos. Um dia na escola convidei Joãozinho pra ir brincar comigo em minha casa. Joãozinho é nome fictício, era meu projeto de namoradinho, embora ele não soubesse de nada, e acho que nunca souve. Ele ia pra minha casa na manhã seguinte ao convite.
Nessa manhã eu acordei muito mais cedo que o normal, e notei que não sabia como me preparar para receber Joãozinho. A idéia era que ele gostasse de brincar no meu quarto tanto quanto eu gostava. Mas fiquei em dúvidas se isso iria acontecer. Na época a menina que trabalhava na minha casa era jovem e bastante extrovertida. Pedi conselhos a ela. Ela não pode deixar de rir da minha situação, mas do seu jeitão tentou me ajudar. A visão que ela tinha da situação era um pouco diferente da minha, a primeira coisa que ela disse. Troque de roupa. Eu vestia algo de sempre, shorts e camiseta, provavelmente alguma combinação de vermelho com verde, eu amava essas cores. Juntas! Ela me mandou usar uma saia e sandálias. Eu tentei aceitar a sugestão, mas quando olhei no espelho, com minha roupa de festa (saias só me serviam pra isso), me achei ridícula, e ela penteava meu cabelo elogiando o novo modelito. Eu não queria decepcioná-la, então fingi que estava gostando. E pedi ajuda na arrumação do quarto. Enquanto ela arrumava minha cama eu troquei os brinquedos que ficavam enfeitando a estante. Coloquei tudo que era mais masculino. Meus bichos de fazenda, meu skate do lado da cama, a família Flintstones que era meu brinquedo favorito, minha coleção de selo, de moedas, de cartões postais, de mapas. Eu adorava coleções. E pensando bem agora, naquela época eu me preocupava muito mais com minha reputação intelectual. A Cleide (não lembro o nome dela) minha ajudante, reprovou a decoração. Me disse que eu deveria colocar meus perfumes, acessórios, e porta retratos. Eu não tinha nada disso. Ela trouxe os que tinha para me emprestar, menos porta retratos é claro. A situação estava totalmente fora do meu controle, e eu não conseguia dizer não à Cleide. Ela tinha boas intenções e estava animada com a situação. Eu já estava com nó na garganta e louca de vontade de chorar.
Pra piorar, Joãozinho chegou. Lembro exatamente do que senti. Pânico! Cleide foi atender a porta e me tranquei no quarto. Estava desesperada. Joguei tudo no chão, tirei a roupa. Chorando de raiva, peguei minha roupa preferida, um macacão listrado de vermelho e branco que já estava na metade da canela, com uma camiseta de manga comprida amarela dos Flintstones, tudo isso com um par de chuteiras pretas de couro.

Joãozinho bateu na porta do meu quarto. Meus brinquedos estavam todos no chão, o quarto estava uma zona, mas eu me sentia bem melhor. Peguei meu skate, abri a porta, puxei Joãozinho pelo braço e fomos descer a ladeira da minha casa de skate. Nenhum momento brincamos no meu quarto.

Hoje eu tenho meu correspondente ao macacão, e uso sempre em ocasiões especiais, como hoje.

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